sexta-feira, 24 de dezembro de 2010

Olhai por nós


Mais um ano que se vai. E que ano. Nunca a aviação brasileira cresceu tanto em um período tão curto. Devemos chegar a 24% de crescimento de tráfego sobre o volume de 2009, que já havia sido um ano de expressivo aumento de demanda e de oferta. Parafraseando o Presidente que sai, "Nunca na história deste país"... Pois é, nunca se voou tanto. E por tão pouco. A gente só não sabe se é para rir ou para chorar.

O nó górdio chama-se - você já sabe, mas não custa lembrar: infra-enstrutura. Sim, se por um lado as companhias aéreas executavam uma vigorosa decolagem, ao mesmo tempo, a infra-enstrutura esteve mais para uma RTO - Rejected Take-Off. Simplesmente abortados foram os investimentos necessários em aeroportos, controle de tráfego aéreo, treinamento e capacitação de mão-de-obra especializada, na compra de hardware e software de controle de espaço aéreo e, no fundo no fundo, em praticamente tudo aquilo que é necessário para garantir o desenvolvimento do setor e de seus profissionais. Noves fora, mais uma vez, muito se falou e ficamos mesmo foi naquela base do país do futuro, da promessa.

Alguns temas que a gente lembra de cabeça: ampliação de Guarulhos e construção do Terminal 3. Terceiro aeroporto metropolitano de São Paulo. Melhorias nas pistas de Congonhas. Retomada das obras embargadas de Vitória e Goiânia. Aeroporto na Baixada Santista. Ampliação de Porto Alegre. Novo caça para a FAB. A lista é mais longa, mas a preguiça de puxar tudo de memória advêm da frustração de pensar na quantidade de itens que o papel comportaria.

A iniciativa privada ganha altitude como um F-22 Raptor, ao passo que os investimentos em infra-estrutura conseguem ganhar altura, assim, como um AeroBoero. Com todo respeito aos confiáveis Boerinhos, mas a imagem que vem a esta miha cachola cada vez mais careca é justamente esta. Donde, está justamente nesta gritante diferença de performance o ninho da serpente. Ou o Brasil acaba com a paralisia no desenvolvimento de sua infra-estrutura (estradas, portos, aeroportos) ou a infra-estrutura frustrará nossos sonhos de Brasil Grande. Simples assim.

O caldo engrossa quando lembramos que a questão, além do que, é de cunho ideológica. O atual governo não tolera privatizações, por princípios. Será que a Nação e o povo Brasileiro vão tolerar mais um mandato que opta por rifar cargos técnicos entre apaniguados e simpatizantes? Haverá mais paciência para terminais em estado terminal? Para portos que nada mais comportam? Ou em vias de rodagem que mais parecem sacanagem? Vide as dramáticas consequências dos Correios, um serviço público que por décadas foi sinônimo de confiabilidade e hoje está aí, em estado desesperador.

O fato é que estamos perdendo mais uma vez o bonde, o aerotrem, o voo da história: a Copa e as Olimpíadas são amanhã. Do ponto de vista de cronograma de obras, licitação, licença ambiental, etc, etc, 2014 e 2016 já estão aí. Vamos encarar um triste fato: no que tange aos aeroportos nacionais, não dá mais para escapar de uma vergonha nacional bruta nos jogos citados. E, até lá, em crescentes dificuldades operacionais, custos elevados para as companhias e má qualidade nos serviços prestados ao público viajante.

Com muita boa vontade, teremos soluções paliativas. E dá-lhe Módulos Operacionais Provisórios, os MOPs. Mas pode chamar de aeroporto de lata, mesmo. E para escoar o fluxo de tráfego nos eventos esportivos, não escaparemos de aeroportos operando H24 durante os torneios. E tome a ter que aguentar as caras viradas dos visitantes, os muxoxos dos turistas estrangeiros, os comentários corrosivos dos jornalistas d'além mar. Eles, tanto quanto nós, vão experimentar as consequências diretas do paradoxo nº1 do Brasil: um país rico em recursos naturais mas, infelizmente, miserável nas suas decisões.

Vem aí uma lufada de ar um pouco mais fresco. A Presidente Dilma assume em alguns dias um país com uma vocação proporcional ao tamanho de seus desafios. O setor aéreo, vetor e termômetro do desenvolvimento econômico de qualquer país, está pronto para e desejando cada vez mais investir no incremento da qualidade, da satisfação, na ampliação e modernização de seus produtos e serviços. As empresas aéreas são tão ou mais vítimas deste quadro do que os seus passageiros.

Nosso mais sincero voto é que a Presidente Dilma olhe para a aviação como uma solução para um país continental, não como um fardo, clube elitista ou décima - sétima prioridade. Avião dinamiza. Avião une. Avião integra. Avião muda, rapidamente, os destinos de uma região, de um povo, de uma Nação.

Presidente Dilma, abra suas asas para o setor e olhai por nós, aviadores, aeronautas, aeroviários, controladores, mecânicos, passageiros. Nós somos milhões, e poderíamos ser muitos mais. Poderíamos voar mais, e melhor, consumindo menos, poluindo menos, chegando mais rápido, com menos stress, atraso, incertezas. Invista no setor e em sua gente. Mostre que a senhora é uma mulher inteligente, destemida, e mude. Ouse.

A Nação, com N maiúsculo, um dia há de reconhecer e agradecer, penhorada e coletivamente, se a senhora soltar as amarras do setor e permitir uma maior flexibilidade na gestão do sistema como um todo. Isso pode ser feito em parcerias público-privadas. Mas nada há de acontecer se não houver pulso firme, decidido, confiante. Vamos, porque o lugar do Brasil é exatamente o mesmo de todo bom avião: lá no alto.

Um feliz 2011 pra você.

Gianfranco Beting

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